segunda-feira, 22 de julho de 2013

Dama da madrugada



Porta trancada, janela com uma fresta aberta e a imprestável programação da TV como trilha sonora de um cenário caótico e perverso. O quarto de paredes brancas mofadas era o mocó daquele jovem, que sem forças de reação, afundava o nariz onde não era chamado.
Todo sábado era assim. Trabalhava até às 22 horas e ficava até uma da manhã vagando pelas ruas sujas daquela cidadezinha. Em seguida, passava na biqueira, comprava pó e caminhava ligeiro para o aconchego do seu lar. A madrugada era uma noiva do mal, que o tirava para dançar os esplêndidos passos vazios da desesperança.
A estante era uma grande amiga. Além de suportar as vozes que saíam da telinha da mentira, também era a mão que estendia a química da escuridão. Entre um tiro e outro, olhos atentos para ver se alguém aparecia. Com medo, não queria ser surpreendido por ninguém, muito menos por seus pais, que dormiam no quarto ao lado.
Pensamentos surgiam e o atormentavam: “Que barulho foi esse? Preciso trabalhar daqui a pouco! Porque estou fazendo isso? Alguém me ajuda!” – triste começo de juventude para um menino que mergulhou na fossa, como um nadador mergulha na grande piscina em busca da medalha de ouro.
O sono desaparecia e só restava a neurose. A vontade de dormir era imensa, porém o efeito não passava. Até o horário de sair para o trabalho, havia tempo suficiente para uma boa reflexão. Aquilo tudo era uma decepção para seus pais, que o criaram de uma forma decente. Também era injusto consigo mesmo, pois trabalhava o mês inteiro e deixava seu salário escorrer pelo ralo.
A depressão o consumia e o sono chegava junto com nascer do sol. Já era hora de trabalhar. Seu cérebro não havia descansado e sua cabeça doía. “Porque estou fazendo isso?”, perguntava a si mesmo. Tomava um rápido banho e enquanto vestia o uniforme da empresa, assistia a missa que passava na tela. As palavras que entravam por seus ouvidos traziam uma mescla de esperança e desilusão.
Sem tomar café da manhã, desligava o aparelho, saia para a rua e caminhava rumo à labuta em pleno domingo. O ambiente deserto não escondia nenhum oásis para seu coração deprimido.
“Tenho que parar com essa porra...” – sua alma gritava.

 

Autor: Marcus Vinicius Machado, latino-americano criado em Santa Isabel – SP. Um dia resolvi sair por aí e descobri que em cada esquina existem várias poesias e contos. Também sou estudante de Jornalismo e criador do blog Sem Sobrenome (100sobrenome.blogspot.com.br).