A última vez que a viu foi na praça no centro da cidade de Ribeirão
Preto. Era uma manhã de domingo e o sol já estava forte. Essa cidade é mesmo
quente. Caminhava devagar de mão dada com
o filho que completaria dois anos no mês seguinte. Não teria reconhecido o
garoto se não estivesse com a mãe. A memória lhe trouxe a lembrança do menino engatinhando
vivamente pelo quintal. Isso fazia
meses. Ela estava linda em seu vestido estampado. O sol a contemplava tanto
quanto ele. Quase disse oi quando se
aproximaram, mas desistiu antes que o
vissem e entrou em uma banca de jornais e revistas. Os dois passaram bem
próximos a banca, ela estava tão compenetrada sendo mãe que não notou sua presença
há alguns metros entre revistas de
esporte, fofoca e sacanagem. Parou e
abaixou-se para amarrar os sapatos do filho. Quando voltou a andar um vento misericordioso
lhe trouxe seu perfume. Os dois continuavam seu caminho agora de costas para
afonso.Pelo movimento dos corpos, percebeu que conversavam. Imaginou um
possível diálogo entre mãe e filho. “Mamãe quero pipoca!" A resposta viria em
uma voz atenciosa e responsável. “Agora não. Pipoca só após o almoço, bonito." Riu
de sua falta de criatividade ao imaginar uma conversa tão clichê. A esquina se
aproximava e pensou mais uma vez em
chamá-la, mas lembrou-se da última vez em que tentou um contato e sentiu seu olhar pesar uma
tonelada sobre seus ombros. Desde que deixaram
de se ver tem sido assim. Barbara o evita e Afonso insiste inutilmente em
resgatar um mínimo de carinho que ela ainda possa ter por ele. Quando enfim dobraram a esquina, sentiu-se de novo
sozinho. Comprou um jornal. Tinha um
cigarro aceso em meio aos dedos de sua mão direita e ia em direção a
cafeteria. Um café quente era o que ele mais precisava. Debaixo do braço
esquerdo tinha o jornal do dia. A cada passo reconstituía na memória tudo o que
aconteceu naquela manhã. Tinha a cabeça baixa. Sentiu um pingo molhar a sua nuca e depois
desse, vários outros. Largou o cigarro e se protegeu com o jornal. Chegou
a cafeteria molhado e pediu um expresso. Acendeu outro cigarro. Enquanto
esperava o café, contemplava a chuva. Pensou novamente naquela manhã e concluiu
que vida continuava e a sua tristeza era só mais uma esquina.
João Francisco Aguiar é um dos editores do âncora zine e desse blog. É professor, conhecido por seus alunos e colegas de trabalho como jofra, baterista da banda Corvo de Vidro. Não acredita em processos de mudança, e sim na ruptura como mudança do real. Se não está satisfeito com o pano de fundo de sua vida, não mude a si mesmo troque o pano, mude de amigos, de cidade e até de planeta se conseguir. Para ele a imaginação supera a razão.